No dealbar da década de 90, o Mundo assistia perplexo à queda de um mito. Petizes choravam rios de lágrimas que desguavam sem apelo nem agravo bem fundo nas incautas almas de todos nós, que apenas imploravam um fim para este desgraçado sofrimento que nos fazia definhar e tornava o povo em meros cadáveres andantes. Sim, os Milli Vanilli eram uma fraude. Desgraça. Tragédia.
Será que aquela sedutora mistura entre a jovial irreverência do reggae, a suave candura de uma balada pop e a hipnotizadora batida ritmada da dance music teria sido apenas um bonito sonho? Basbaques mal intencionados vociferavam alarvemente que as angélicas e pungentes vozes - a fazer lembrar um guardião do Sporting Clube de Portugal - do harmonioso duo Rob e Fab não seriam realmente as deles. Ignomínia! Que o playback seria a poção mágica dos seus sublimes concertos e que as formosas vozes que se ouviam no seu album de sucesso teriam sido cantadas por outros pobres diabos. Vitupério!
Pois bem, no infame dia 12 de Novembro de 1990 - jornada marcada a sangue escarlate no calendário de qualquer amante da vida que se preze - esta suspeita seria confirmada pelo agente do ex-duo maravilha.
Foi o dia em que todos nós perdemos a inocência. Os Milli Vanilli cairam em desgraça e com eles arrastaram, numa dolorosa espiral de decadência, todo o espírito e moral da civilização Ocidental.
Porém, um par de anos após a tragédia que mudou a face do Planeta Terra, os sábios responsáveis do Vitória Futebol Clube, agremiação sita na amistosa localidade de Setúbal, Land of The Yekini, decidiram devolver o sorriso ao atormentado povo terráqueo. Num encantador assomo de altruísmo, os sadinos definiram a estratégia para colocar o clube nas bocas do Mundo: reunir Rob e Fab, desta feita no gracioso relvado do Bonfim. Não eram jogadores de futebol? Não há problema. Estamos a falar de um clube que viria a albergar Nogueira uns anos mais tarde.
Os primeiros contactos efectuados revelaram-se uma enorme montanha - tipo Vujacic - impossível de escalar. Rob encontrava-se a trabalhar como assistente do controlador de qualidade de comida de gato no Tajiquistão, enquanto Fab labutava como estagiário na indústria de remoção de fezes de ratazana nos esgotos de Nay Pyi Taw, Myanmar, ex-Birmânia.
Derrotados por não lhes conseguirem oferecer melhores condições em Setúbal, os dirigentes sulistas, sempre argutos, usaram a história em seu favor. Pois se os verdadeiros Milli Vanilli não passavam duma espécie de duplos, que melhor solução para o busílis do que arranjar um par de duplos deles próprios? Assim foi.
Seguindo uma linha de pensamento muito própria do balón luso, o primeiro passo seria buscar um refugiado à Serra Leoa e pô-lo a treinar(na verdade, o gajo veio de Castelo Branco, mas assim soa melhor). Eis Sessay.
O seu compagnon de route teria obrigatoriamente que falar com o adocicado e cantante sotaque de Vera Cruz. Procedimento? Uma viagenzita à Maia. Mete jogador no carro. Arranca. Veste camisola verde-e-branca ao jogador. Setúbal. Trava. Ajeita o bigode. Sai do carro. Inventa frase à pressão. Apresenta "esta grande esperança do futebol brasileiro, ex-internacional das camadas jovens, chegou mesmo a relegar o Cafú para o banco". Palmada nas costas do jogador. Posa em conjunto para os flashes. Sai em triunfo. Eis Elísio.
Sucesso? Nem por isso. Os sadinos, gente conhecedora da esfericidade da bola, cedo se deram conta que o abichanado duo não era mais que uma reles imitação de Kiki, mas - horror - em duplicado.
De Setúbal para o Mundo, as notícias correram céleres (ao contrário de Sessay), e o Planeta chorou. Lágrimas de sangue, despojos vencidos de uma falsa esperança copiosamente derrotada pela lei do esférico. Pois o regresso fora implacavelmente abortado. A bola não mente.
Post Scripum Cromatium: Ao jeito de off-topic, um pensamento solto: que belo teria sido se o ex-amadorense Mazo tivesse jogado na equipa do Sado.